(Reflexões com Indra, minha filha mais velha, por ela me mostrar outro exemplo de um jovem indo bem com sua arte. Ela considera ‘coragem’ dele ter ido contra todas as pressões que forçam a seguir o rumo “convencional” de faculdade etc.):
Pra pessoas com esse talento, coragem não é aguentar a pressão dos outros. Coragem é sucumbir às pressões e seguir o caminho da insatisfação e da manada. Ouvi isso também, que eu era ‘corajoso’ por optar pela ilustração em vez de seguir a carreira acadêmica padrão de mestrado, doutorado, ser professor universitário etc.
Eu sempre respondi que não houve coragem alguma nisso, que coragem eu teria que ter era pra aceitar menos do que o desenho me dava. Se o desenho me dava tamanha gratificação, coragem mesmo seria abandonar isso em nome de outras promessas como status ou grana “garantida” (!?!…).
Eu sempre disse que eu era incapaz de seguir um caminho em que eu não estivesse de coração. Coragem nesse sentido meio distorcido seria isso, viver sem coração. Mas a verdadeira coragem é agir com coração.
Coragem vem de coração. Pessoas de cor-ação cor-agem.
As “pressões”….”cada vez maiores” para fazer faculdade e blablabla são pressões de quem sobre o quê??? Pressões dos outros sobre a forma que você deve levar a sua vida? O que eles têm com a vida de quem quer que seja?
E se alguém quiser virar índio de novo e viver da mata? Ou andarilho vendendo miçangas? O que diabos esse povo da pressão tem a ver com a vida do outro? E se alguém quiser se privar de comer e de morar, ser eremita, viajante, mendigo?? É só da vida desse alguém que se trata, e da de mais ninguém. Essa pressão é simplesmente arrogância de quem quer que a faça.
Cada um tem seu caminho único e ninguém tem nada com o caminho do outro. Para eles sucesso é isso, essa conta bancária cheia, carro na garagem e bastante álcool em volta pra anestesiar as frustrações de não ter sido corajoso pra sair do bando. Sucesso pra mim é simplesmente ser capaz de ser si mesmo sem seguir manada nem pressão de voz nenhuma.
No final não importa o que conquistei, mas sim que não me deixei perder de mim mesmo. Sucesso não é felicidade, mas sentir que estamos vivendo exatamente o que deve e precisa ser vivido. E às vezes o que precisa ser vivido é a dor e a tristeza mesmo. Sem chuva não verdeja o campo.
Será que não é óbvio que o pessoal da pressão morre de medo desse povo que sai da manada? Eles forçam a pessoa a retornar à manada porque os que saem das curvas deixam evidente que é possível outra vida.
Eles mostram que a manada é bunda mole, e a manada não quer ver isso. Ela não quer descobrir que é possivel seguir o que realmente deveria ser seguido. Eles têm pânico em sair da zona de conforto coletiva onde as opiniões gerais os acolhem.
Ficam apavorados ante a mera desconfiança de que outra forma de vida é possivel, mas é uma vida que exige que confiem apenas em si mesmos… e que tomem decisões sem consulta e sem apoio de mais ninguém. Por isso precisam resgatar e doutrinar os fujões, para evitar encarar essa realidade.
Acontece que sempre haverá fujões irrecuperáveis e indoutrináveis. Não porque eles sigam exemplos de alguém. Eles se tornam sempre mais um novo exemplo, pois os fujões não formam novas manadas de “outsiders”. Cada um deles vive segundo suas próprias leis.
Texto de Rogério Lupo – 2018
Leitor do Blog Devaneios Filosóficos
#VocêJáParouParaPensar?
Sobre o Autor:
Rogério Lupo é biólogo com especialização em botânica, concluiu bacharelado em 1997 pela Universidade de São Paulo. Estudou desenho e pintura na Escola Clássica de Arte com Prof. Angel Martínez. Desde 1998 atua como Ilustrador Científico free-lancer para importantes centros de pesquisa de universidades estaduais em São Paulo ou federais em diversos estados, ministrando também cursos nessas instituições ou em outros âmbitos de ensino de arte, e também em sua residência. Tem domínio de diversas técnicas artísticas e pesquisa inovações e aprimoramentos práticos de cada uma: grafite, nanquim a bico de pena em hachura ou pontilhismo, aguada de nanquim, acrílico, aquarela, scraperboard, lápis de cor, pastel. Seu trabalho vem sendo bastante reconhecido no Brasil e no exterior, tanto no meio acadêmico como nos meios específicos da ilustração científica, tendo angariado alguns prêmios e participações em importantes concursos e exposições nacionais e internacionais. (Texto obtido aqui)
Saiba mais…
Desde bem pequeno apaixonado por desenho e pela diversidade do quintal, exultei ao descobrir que a biologia e a arte se unem tão harmoniosamente: ilustrar é uma ciência e estudar a vida é uma arte.
(Rogério Lupo)
Notas do Blog Devaneios Filosóficos:
01) A publicação desse texto foi autorizada pelo autor (Rogério Lupo) em 16 de Maio de 2018.
02) Esse texto foi copiado na íntegra a partir daqui.
03) As fotos do autor foram obtida aqui.