Historicamente, no que diz respeito ao Cristianismo, a figura de Jesus assumiu muitas representações, dando origem a inúmeras doutrinas cristológicas. Além disso, muitas foram as análises acerca de cada detalhe dessa enorme religião, sendo a sua simbologia algo realmente extenso e surpreendente. Sobre Jesus, alguns historiadores consideram, inclusive, a possibilidade de que Ele nem existiu. No entanto, mesmo entre aqueles que o reconhecem como personagem histórico e religioso, desde o princípio da era cristã dividem opiniões sobre a sua natureza. Da mesma maneira, sobre a simbologia cristã, mudanças fazem-se notáveis desde que foi criado o Cristianismo, dividindo práticas ao redor do globo, e impactando a vida de multidões mundo afora, até hoje.
Uma das mais notáveis representações do Cristianismo, atualmente, é a Cruz. Acho curioso que, dentre todas as maravilhas que Cristo operou – segundo a Bíblia -, sua imagem na cruz tenha se sobressaído e alcançado representatividade mundial, ao ponto de valer-se como um símbolo, sobretudo, motivacional.
Nesse contexto, Geoffrey Blainey – um historiador australiano – fala algo muito interessante em seu livro Uma Breve História do Cristianismo, que vale a pena ser compartilhado:
“Por dez séculos Jesus foi representado como um jovem herói que pregava e operava milagres. Às vezes personificando o rei dos reis ou o juiz supremo, raramente aparecia pregado à cruz, o que seria considerado degradante para a figura principal de tanta grandiosidade e injusto em relação ao próprio cristianismo. Ao observar a talha encomendada a um artista por Gero, arcebispo de Colônia, por volta de 969, pode-se ter uma ideia da mudança de atitude. Jesus aparece pregado a uma cruz de madeira. Suas feições são fortes, mas ele parece abatido. Preso e humilhado, tem os olhos fechados. Em pouco mais de um século essa representação triste do Cristo crucificado se tornaria bastante comum.
A cruz de madeira e o Cristo moribundo, imagens cada vez mais presentes, transmitiam uma mensagem acerca da morte, inevitável, e dos horrores do inferno. A própria era medieval parecia carregada de nuvens escuras de pessimismo.“
Nesse sentido, acredito que existem certos pontos destoantes em relação à maneira como as pessoas utilizam a imagem (ou o simbolismo) da cruz. Dizem uma coisa, mas fazem outra totalmente distinta. Todavia, antes de prosseguir no assunto, acho importante esclarecer que eu não estou aqui para condenar ou defender determinadas práticas. Sou satisfeito por não ter esse posicionamento exterminador ou privilegiador. Prefiro apenas devanear filosoficamente sobre o tema, expondo criticamente minhas ideias sobre o assunto. Obviamente que você tem total liberdade para interagir comigo, deixando o seu posicionamento nos comentários – levando em conta que estamos aqui para crescermos no conhecimento. Dito isso, voltemos ao assunto.
Hoje é 31 de Março, véspera da Páscoa. Para qualquer lado que você olhe, certamente verá movimentos que remetem, no mínimo, a uma recordação sobre o padecimento [sofrimento] de Jesus sobre a cruz – seres humanos bons e amáveis estão por toda parte, sempre generosos e empáticos. Há, ainda, dizeres como “só quem nos amou morreria por nós na cruz“, ou, dizendo de outra forma, “a maior prova de amor que alguém pode me dar foi feita por Jesus, que morreu por mim na cruz“. Tudo bem, é uma questão de fé, é algo pessoal. Mas suscitar questionamentos faz parte desse Blog, então, vamos pensar. Essas frases são ditas por que razão? Há uma razão? Você já parou para pensar nisso?
De certa forma, a morte na cruz não foi, nem de longe, o maior exemplo de amor que o Cristo deixou. Independentemente de eu crer ou não em Jesus, como bom leitor e questionador, reconheço que o personagem bíblico é no mínimo interessante – mas, não porque morreu na cruz. Muitas pessoas antes e depois Dele morreram dessa forma, outras, inclusive, pelo mesmo motivo: porque pregavam uma crença que era estranha à época – vide os casos dos apóstolos. Ele [Jesus] é interessante porque trouxe ao mundo uma forma verdadeiramente humana de ser e de agir, deixando bem evidente a importância da compaixão, da empatia, do comprometimento com o próximo, além de inúmeros exemplos de humildade e de controle emocional. Isso sim merece e deve ser lembrado – pena que é o mais desconsiderado diariamente, como se fossem “cristãos” que não vivem o cristianismo. Antes, preferem professar a morte na cruz como um ato de amor e sacrifício, talvez por acharem mais comovente, ou por suporem que convence melhor caso deseje-se um ato proselitista.
A grande questão que reside no motivo de ser a cruz o grande símbolo é um tanto quanto curiosa. Como destacado no trecho do livro, bem como na historiografia das religiões e das sociedades, fica evidente que para a unificação de várias pessoas e povos é indispensável a criação de uma ordem imaginada. Tal ordem unirá povos quer seja por tratar-se de um ponto de convergência entre suas ideias e necessidades, quer seja porque lhes garante algum benefício, direta ou indiretamente. A necessidade de criar uma ideia de fragilidade, pautada na brevidade da vida humana, enaltecendo – por meio do sofrimento – os medos e as angústias comuns a todos os humanos tem funcionado muito bem. Pintar o céu de branco e dourado, com anjos, leite e mel e enegrecer o inferno, adicionando cheiro de enxofre e gritos assombrosos é, sem dúvidas, uma ideia que funcionou (e que ainda funciona) muito bem. Essa polarização entre os dois ambientes fez (e faz) com que multidões temam a eternidade no lago de fogo, ao passo que buscam alguma maneira de se atingir o céu – se preferir, inclua o Purgatório no meio do caminho. Para piorar o cenário, essas multidões submetem-se a acreditar em tudo, sem o menor desejo pela veracidade do que é dito, simplesmente porque foram convencidas de que o céu é o destino áureo, e vale tudo para ascender a ele – incluindo a ausência da reflexão.
As igrejas, sem excessão, precisam de uma ferramenta que as permita convencer às pessoas de que algo deve ser feito para que se mereça a vida eterna no céu. Esse algo, de preferência, deve ser destacado geralmente na forma de uma abdicação forçada e/ou de uma renúncia induzida. E a maior das renúncias, ao meu ver, é a limitação imposta aos seus seguidores sobre os questionamentos relacionados a qualquer assunto. Geralmente, cristãos não são estimulados a refletirem sobre a vida de uma maneira mais ousada. Nascem ouvindo que Deus existe e que Cristo morreu por eles, mas não ousam em se perguntarem se de fato Eles são reais – isso seria uma blasfêmia! É melhor ser “forçado” a crer pela impossibilidade do questionamento. Ou será que vale a pena arriscar-se a buscar por respostas que não se limitam à uma crença propriamente dita (ou à Bíblia)? As igrejas – e seus seguidores – diriam que já temos todas as respostas dentro de um único livro, ou, a depender do grau de “santidade” de cada um, vindas por revelações celestes. Mas, eu insisto em acreditar que uma pessoa que se questiona tem ao menos a oportunidade de adquirir um conhecimento mais sólido, e pode saber por onde anda e para onde deve ir, enquanto aquela que prefere as respostas prontas está fadada à obediência fomentada pelo castigo.
Acredito que, se Deus existe, Ele não tem interesse em controlar a mente ou a vida de seus filhos. [na minha opinião] Um Deus, para que assim o seja, deve ser justo – o que implica em dar a real liberdade de escolha aos seus filhos amados. Ser adorado por obrigação não é tão diferente de assumir uma tirania e ampliar o número de seus súditos sob a ameaça de dores e sofrimentos. Então, fica a pergunta: se Deus não controla a sua vida, quem o faz?
Atribui-se a Voltaire um dizer de que “para saber quem controla a sua vida, simplesmente descubra quem você não tem permissão para criticar“. Eu complemento dizendo que, se Deus não te impede que o critique – no sentido de que você O questione – alguém está fazendo isso, num processo de usurpação. Se você costuma ler a Bíblia, sabe que ela diz “Amados, não creiais a todo o espírito, mas provai se os espíritos são de Deus, porque já muitos falsos profetas se têm levantado no mundo” (I João 4:’7). E cá entre nós, seria muita ingenuidade (ou uma ação mal intencionada) tentar fazer prova de algo baseando-se somente nesse próprio algo. Ficou confuso? Pois bem, digo que, se você quer realmente conhecer sobre um assunto, busque em fontes variadas, incluindo as contrárias ao seu pensamento. Viver lendo somente sobre aquilo que concordamos e falando exclusivamente com pessoas que sempre concordam com o nosso ponto de vista não ampliará o nosso olhar sobre a existência nem sobre o mundo; pelo contrário, apenas fortalecerá determinados dogmas. (Não exagere, também não precisa discordar de tudo e de todos a todo momento. Seja inteligente!)
Por isso, aceitar a ideia de que devemos carregar a cruz para sermos, então, considerados legítimos não é algo que entra na minha cabeça hoje. Certamente que nem o Cristo desejou carregá-la. Se o fez, foi porque estava sob extrema tortura e pressão (física e intelecto-espiritual). Por que Ele haveria dito “se possível, faz passar esse cálice de mim“? Duvido que Ele disse essas palavras porque a situação era agradável!
Hoje, pessoas usam essa imagem – que representa sofrimento – simplesmente por costume; no máximo pela esperança em recompensas, em busca de uma vida melhor. Vale ressaltar que no caso bíblico foi um sofrimento com propósitos bem estabelecidos, gerados por uma causa nobre, que foi a propagação de uma ideia de amor – ao pregar um novo estilo de vida, Ele foi perseguido e, por fim, crucificado. O Cristo não deve ser considerado bom porque foi crucificado. Acho mais inteligente acreditar que Ele foi crucificado porque [Ele] era bom. E quanto aos que falam da cruz? Que sofrimento passam para que seja, de alguma forma comparável? Muitas pessoas buscam no evangelho e nas religiões uma resposta para suas angústias naturais, sendo fiéis até o momento em que são atendidas; depois, simplesmente vão embora sem nada terem aprendido. Outras, por sua vez, são “éticas” e seguem uma vida “digna” de uma pessoa de valor, simplesmente porque o céu é uma promessa – e que promessa! O terror e a ganância imperam nesses pensamentos… não se ama de forma incondicional, mas com interesses puramente egoístas e avarentos. Quem faz isso jamais estará sendo um cristão, sim um humano canalha e aproveitador! Quem ameaça a vida do outro por uma recompensa impalpável e invisível não é honesto, mas manipulador. Um manipulador das peças no tabuleiro da vida. E, claro, o medo entra nesse jogo como a peça principal; sem ele ninguém seria comovido e/ou convencido.
Por isso digo: não precisamos carregar a cruz! Se algo deve ser carregado, que seja a mensagem principal de caridade e atenção às pessoas. Fugir dessa temática é inventar um novo “ismo” – a crença do medo, da crucificação como motivação e da alienação como consequência. A cruz que transmite uma mensagem acerca da morte, inevitável, e dos horrores do inferno não deveria servir de propulsão, os atos praticados pelo crucificado, sim. Anime-se em ser mais humano e menos egoísta, em servir mais que ser servido, seja alguém útil à vida de outrem. Se o ego te é como um espinho na carne, use-o para furar a sua própria bolha e liberte-se do ideário manipulador (manipulação essa que pode partir de sua própria mente, quando acomodada na zona de conforto).
Um detalhe muito importante: Não seja melhor apenas em datas comemorativas, elas passam e, na maioria dos casos, só precisam do seu dinheiro para existirem. Seja melhor sempre, dias após dia!
Feliz Páscoa Ser-Humano melhor!
#VocêJáParouParaPensar?
Andreone T. Medrado
Devaneios Filosóficos
Primeiro gostaria de dizer que concordo plenamente com tudo ou quase tudo que escreveu, já te falo o por que, historicamente nenhum Historiador sério questiona o fato de Jesus ter existido como ser Humano, alguns exemplos de fontes sobre Cristo- Flávio Josefo (37 – 100 d.C)foi o mais importante historiador judeu do século I, e seus escritos são bastante utilizados nas mais diversas áreas que envolvem a história daquela época, mais especialmente à guerra entre Jerusalém e Roma em 70 d.C, narrada por Josefo com detalhes. Como judeu e historiador, ele não deixou de expor aquilo que notoriamente ocorreu na Palestina pouco antes de ele nascer: o homem chamado Jesus. •
Tácito (55 – 120 d.C).
Públio Cornélio Tácito foi governador da Ásia, pretor, cônsul, questor, historiador romano e orador. Em seus “Anais da Roma Imperial” mencionou Cristo e os cristãos de seus dias. No ano de 64 d.C, o imperador Nero mandou incendiar Roma e colocou a culpa em cima dos cristãos. Isso culminou na primeira grande perseguição aos cristãos, que levou ao martírio milhares deles, incluindo Paulo e Pedro.
Plínio, o Jovem (61 – 114 d.C)
Caio Plínio Cecílio Segundo, mais conhecido simplesmente como “Plínio, o Jovem”, foi um orador, jurídico e governador imperial na Bitínia. Em suas cartas ele confessa que já tinha matado muitos homens, mulheres e crianças, e, em função dessa grande carnificina, tinha dúvidas se deveria continuar matando. E aqui entra o detalhe que é a razão de todo o nosso foco: essas pessoas estavam sendo mortas por se dizerem cristãs.
Suetônio (69 – 141 d.C)
Caio Suetónio Tranquilo, ou simplesmente Suetônio, foi um grande escritor latino que nasceu em 69 da era cristã, em Roma. Suetônio era o historiador romano oficial da corte de Adriano, escritor dos anais da Casa Imperial. Ele também faz referencia a Cristo e aos seus seguidores. Na Vida dos Doze Césares, publicada nos anos 119-122, diz que o imperador Cláudio expulsou os judeus de Roma por causa de um certo Cresto [Cristo].Estas são apenas algumas fontes e um escritor muito renomado,Bart D. Ehrman um estudioso estadunidense escreve sobre o Novo Testamento da Bíblia. Ele é professor e chefia o departamento religioso da Universidade da Carolina do Norte. Era evangélico mas posteriormente tornou-se agnóstico. É presença constante em programas de televisão e rádio por ser uma das sumidades nos estudos sobre o cristianismo e a vida de Jesus. É constantemente requisitado pelas redes NBC, CNN e History Channel, escreveu O que Jesus Disse? O que Jesus não Disse?, Quem Jesus Foi? Quem Jesus Não Foi? São Paulo: Ediouro, 2010;entre outros.
Bem deixando claro só este ponto que discordo, que é o fato de que Jesus é historicamente comprovável sem o mínimo de dúvida, podemos partir para o segundo ponto, você esta correto, temos hoje um bando de religiosos alienados, que não pensam, não refutam, não lêem, nem sabem por que são protestantes, afinal protestaram contra o que? os pentecostais e neopentecostais então nem se fala, é alucinação pura, a maioria do que vemos ai são os verdadeiros anti cristos pois Jesus foi contra os religiosos de seu tempo, e o que mudou de lá pra cá? na verdade só piorou, então ótima reflexão precisamos sim questionar, dúvidar e pôr á prova, em Atos 17: 10-12 – “E logo os irmãos enviaram de noite Paulo e Silas a Beréia; e eles, chegando lá, foram à sinagoga dos judeus. Ora, estes foram mais nobres do que os que estavam em Tessalônica, porque de bom grado receberam a palavra, examinando cada dia nas Escrituras se estas coisas eram assim. De sorte que creram muitos deles, e também mulheres gregas da classe nobre, e não poucos homens.Sou à favor que se questione, que se pesquise, que se indague NA BÍBLIA, como os bereanos de Paulo fizeram depois de ouvir sua pregação. Paulo pregava, e depois, cada um ia conferir nas escrituras, se o que Paulo dizia era verdade ou filosofia humanista, e que também se questione fora da Bíblia, em tudo que puder trazer enriquecimento intelectual, que assim seja feito, a cruz foi necessária, mais o maior de todos os mandamentos ainda é o AMOR, por isso, que nos amemos.
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Falou bonito e abrangente, concordo com tudo. Infelizmente, as pessoas preferem excluir ao ler, considerando uma heresia e não uma reflexão. Que continuem em suas religiões; acredito que a intenção não é essa, mas de trazer
reflexão e conhecimento aos que, as vezes, por hábito e medo de perder a recompensa não o faz por si só. O mundo se diz tão evoluído e as mentes se mantém fechadas ao conservadorismo egoísta e limitado. Se, pra quem segue as ” leis divinas”, está cômodo receber o pão na boca, imagina pra quem o faz, né?
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