Era uma manhã qualquer,
num dia que amanhecera tal como gosto:
com alguns raios de sol, mas sem a sensação de fornalha.
Decidi que seria interessante plantar umas mudas no meu quintal.
Fui e escolhi a muda da dúvida,
dizem que ela cresce bem rápido,
e que seus frutos são carnosos e [às vezes] doces.
Peguei as perguntas a pá,
desci alguns degraus entre a sala e o quintal,
acomodei as mudas na escada,
plantei-as – duas ou três -,
e segui o processo de escavação;
comecei a cavar, então, no ponto do quintal que eu considerava o mais lindo.
aquele que nós costumávamos…
[…]
“Mas o que é isso?”
Num certo momento, cavando cuidadosamente,
senti que a pá batia em algo mais rígido que a própria terra,
mas não tão duro quanto uma pedra.
A cada movimento de escavação, um choque mais forte.
De repente, dedos humanos.
Assustei-me com a cena.
Tive pavor em continuar…
mas sabia que se não o fizesse também não teria paz,
e ficaria atormentado pela cena que não se completava,
mas que anunciava um mistério;
bem ali, no quintal.
Foi a escavação mais tenebrosa da minha vida,
eu queria plantar umas mudas;
contudo, a cada movimento que eu fazia com a pá,
a cada punhado de terra que dali eu arrancava,
mais um membro se mostrava.
Mãos,
braços,
tronco,
pernas…
medo e mistério.
Estava ali,
no quintal,
bem em frente à mesinha onde eu costumava tomar meu café todas as tardes e ler os meus livros preferidos;
“bem na minha cara!”
No lugar mesmo em que nós passávamos horas falando sobre vida, estava enterrada a morte;
no mesmo quintal que colhíamos nossos frutos,
algo foi furtado da própria vida,
foi posto ali, enterrado por alguém de sangue frio.
Naquele buraco, agora enorme, e de terra esvaziado,
estava um corpo frio e apático.
Um corpo enorme, apático e frio!
Havia um corpo enterrado no nosso quintal.
Enquanto eu olhava a cena quase eu quem me congelava por dentro;
foi quando a minha pá caiu junto ao corpo;
tentei apanhá-la sem tocá-lo, e quando a alcancei, vi uma carteira de identidade toda suja… de terra.
Não resistindo, abri-a com uma curiosa calma apressada para ver se constava ao menos o nome do corpo.
E constava!
Estava escrito “Verdade Acovardada“.
O absurdo revelado!?
Enterraram a Verdade no nosso quintal!
E naquela manhã, eu a descobri…
… da pior maneira possível.
Quando fizeram aquilo?
Realmente eu não sei.
Mas suspeito que fora enquanto eu dormia.
Ou havia sido naquele inquietante 21 de novembro?
A cada módulo daquela carteira suja, estava um documento que do corpo dizia algo,
a cada documento uma informação sobre o cadáver,
a cada informação, um choque para mim…
“Esconderam a verdade no meu quintal,
e hoje a desenterrei!”
Fiquei preocupado e ao mesmo tempo sem coragem de levantar o pano que cobria o rosto do cadáver.
Mas tive de o fazer…
até hoje não acredito que enterrado no meu quintal estava um corpo…
E não acreditei – se é que acredito verdadeiramente – no que as evidências, e depois a perícia, mostraram: que foi você!
Sim! Foi você, com as mesmas mãos que me acariciavam, quem enterrou um corpo no meu quintal!
E já fazia tempo!
Mas o descobri naquela manhã de um dia qualquer.
* * *
Andreone T. Medrado
Devaneios Filosóficos
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NOTA: a imagem utilizada para compor a capa dessa publicação foi obtida aqui.