Há um dragão;
um dragão no peito de Elliseu.

Às vezes dormindo, às vezes acordado, o ser está ali,
transparente o bastante para não ser notado,
mas opaco o suficiente para barrar a luz que vem pelas suas janelas.

O dragão que nele habita mistura-se com seu sangue,
tornando-se vermelho;
ou mistura-se com suas lágrimas,
e, então, é transparente;
seja como for, é dor pontiaguda o que um traz e o que o outro sente.

O peito de Elliseu aperta, expande, arranha, constrange-se;
achava-se com segurança que o dragão havia morrido, ou que dormira para sempre;
pensou mesmo que o monstro havia desaparecido
quando as portas de seu peito foram abertas,…

…mas todo dia é a mesma noite na vida dessa criatura humana.

Fundidos numa só criação de vicissitudes estavam ambos,
Elliseu no dragão,
o dragão em Elliseu.

A calmaria interior, essa mesma que lhe salta à face em forma de plenitude,
confunde-se com a turbulência dos afazeres lá fora,
o dessossego do dia a dia empresta-lhes o sonífero necessário para o engodo,
a imaginada infinitude da noite engana-lhes o tempo de vida;
sucumbem num só golpe social à apatia ilusória de que, por não dar tempo de sentir, o sentimento não existe;
que, por não dar tempo de pensar, o pensamento morre;

Mas continua tudo ali, como um dragão que cospe fogo.
Se entre um incêndio e outro cresce a vegetação,
linda, verde-esperança, frondosa confiança,
logo menos, uma hora ou outra, torna-se a virar chamas

Apegados ao medo do apego,
presos à ideia de liberdade,
felizes na maior infelicidade vestida de novidade!
Assim estão eles, o medo e o medroso;
a brasa e o fogo.
Elliseu e o dragão.

Há, porém, quem negue, inclusive el.e,
mas a verdade é que existe um dragão no peito de Elliseu,
o nome do dragão é o mesmo desde sempre,
e ele está ali, vivo, cheio de chamas esperando ser chamado;
e basta que se mexa um pouco para ser notado.

Reza a mitologia que ao nascer o humano foi amaldiçoado a viver assim,
com esse dragão no peito;
se quiser se livrar do dragão que cospe fogo deve pular no lago de anestesias;
mas se ao pular no lago morno e florido ele mata o dragão, esse mesmo ato lhe tirará a própria vida,
morre-se afogado ao afogar o monstro.

Essa noite Elliseu acordou de sobressalto;
o dragão estava transparente;
tinha passeado por sua mente.

Até quando viverá Elliseu desse jeito,
que tem um enorme dragão em seu peito?

* * *

vjppp

Andreone T. Medrado
Devaneios Filosóficos

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NOTA: a imagem utilizada para compor a capa dessa publicação foi obtida aqui.