Muitos de nós, talvez pela profunda imersão no mundo digital – no qual a informação parece crescer em escala logarítmica -, não nos damos conta da importância de um registro que conte história e que possa transformar vidas.
É só uma ideia…
#VocêJáParouParaPensar que, hoje, fotos são postadas nas redes sociais de maneira quase que assustadora? No Brasil, por exemplo, são postadas cerca de 95 milhões de imagens por dia, só no Instagram. Textos e mais textos, memes e mais memes são escritos e montados a cada segundo internet afora. Os questionamentos que ficam são (entre muitos outros): Que história está sendo contada a partir de tudo isso? Ou melhor, existe um propósito maior nessas ações que extrapolem o mero desejo pessoal e narcísico de cada um ao deixarem seus “rastros” por aí? São perguntas que poderiam fazer-nos agir precipitadamente e responder um “sim” ou um “não” a cada uma delas de imediato. Sugiro-te cautela! Digo uma coisa em vários textos, mas não custa repetir aqui: Não devemos avaliar o mundo apenas pelas nossas “lentes” particulares – elas servem com mais precisão, às vezes, somente para nós mesmos. Eu disse às vezes! Portanto, uma sugestão interessante é pegarmos emprestadas as lentes de outras pessoas que enxergaram e/ou enxergam mais longe, ou também mais de perto. Mas isso é só uma ideia.
O Registro como ferramenta – História é Saber!
A importância do registro é inegavelmente algo que constatamos ao longo do tempo. A humanidade escreve praticamente tudo que lhe vem à mente, e isso resulta no volume de livros que existe disponível na nossa sociedade. Você sabia que, segundo cálculos do Google, o número de livros que já foram publicados na História Moderna seria de aproximadamente 130 milhões (ou, 129.864.880 para ser exato)? Estamos falando de Idade Moderna, mas o hábito de registrar existe desde muito antes. Papiros egípcios deixam prova dessa tão distante arte de registro na forma de um livro primitivo; ademais, de acordo com os historiadores, considera-se o “nascimento da história” como a partir da invenção da escrita (há aproximadamente 4000 a.C, pelos Sumérios). Não obstante, isso não me parece o suficiente para definir a data e a importância do registro como formador de identidade e propagador de saberes. Nem só de pão escrita vive o homem, mas de toda forma de expressão que, de um jeito ou de outro, contam de si ao mundo. Escultura, pintura, música, culinária, gestos, objetos, etc., tudo isso é muito representativo e carrega em si uma história que transforma vidas, cujo valor intrínseco reside na arte de ser registrada e acessada.
No que diz respeito à escrita, penso que ela é uma forma nomeada pelo Homo sapiens para a reunião de símbolos que formam códigos e que expressam ideias, e que foi estabelecida como um marco histórico, ajudando a organizar uma cronologia que facilitasse os estudos (mas que é, como sempre, limitada e recheada de lacunas). Nesse sentido, voltando ainda mais nessa linha do tempo, mas falando sobre outras maneiras de inscrição, pinturas rupestres deixaram registros de visões muito antigas sobre a vida e suas percepções pelos diferentes povos. Acredita-se que registros de pinturas em cavernas datam de mais de 12 mil anos; atualmente essa data é questionável, uma vez que foram encontradas pinturas rupestres em cavernas da Indonésia que remontam mais de 39 mil anos. Mas, se pintura é uma forma de registro, a escultura também o é; e, nesse caso, as datas oficiais vão ainda mais longe. A famosa escultura da Vênus de Willendorf, esculpida entre 28.000 e 25.000 a.C, mostra como o ser humano pratica a arte do registro há um tempo considerável.
Um registro biológico?
Seja por motivos pensados ou impensados, egoístas ou não, é notável o fato de que sempre documentamos nossas “pegadas” na areia do tempo. Entretanto, fazer registros de dados é algo muito mais antigo que o próprio H. sapiens ou que qualquer outra espécie já conhecida [no planeta Terra]. Do ponto de vista científico, informações são registradas de maneira bioquímica em moléculas de RNA (há aproximadamente 4 bilhões de anos) e posteriormente com a participação do DNA. Esses registros são, de longe, os mais antigos e os mais importantes dentro daquilo que nós chamamos de transmissão de informação. A história da evolução da vida biológica na Terra segue informações sob a forma de bases nitrogenadas, que se combinaram ao longo de bilhões de anos e deram origem a novas formas de vida que juntas contam uma história maior – a história da “vida” (biologicamente falando, a história da evolução e diversificação das espécies).
Se a vida biológica é como a vemos atualmente, parte disso deve-se ao armazenamento e propagação de informações, as quais ocorreram de forma aleatória e, às vezes, pontuais. Mais uma vez recai a pergunta: que história está sendo contada a partir de tudo isso? [nesse caso, a resposta é bem mais palpável… porém, bem complexa] Quanto a perguntar se existe um propósito maior nessas ações que extrapolem o mero desejo individual e biológico de cada organismo, ainda é cedo para conclusões. Eu, sendo biólogo, tenho algumas opiniões, mas podemos falar delas nos comentários, caso queiram – ou, se preferirem, que tal uma publicação sobre isso? Enfim… pensemos!
Falando mais da importância do Registro
O que de fato quero dizer com tudo isso é simples. Se a vida na Terra existe pelo acúmulo e pela propagação da informação, nós humanos tratamos de reinterpretar esses dados e de constituir sociedades que são baseadas nessa dinâmica de uma maneira ainda não identificada com tanta precisão em outras espécies. Temos a habilidade de registrar o conhecimento e transmiti-lo às futuras gerações e, com isso, formar uma linha de raciocínio que não precisa ser desenvolvida sempre que alguém tem uma nova ideia. Com isso ganhamos tempo e praticidade – sem dizer que a cada geração o volume de informações disponíveis é cada vez maior. Você já imaginou como seria inviável ter que descobrir e manipular o fogo, os metais e o Princípio da Flutuação de Arquimedes sempre que um navio precisasse ser construído? Além disso, graças ao registro que pessoas incríveis fizeram, eu tenho essa oportunidade de unir diferentes símbolos e códigos na forma de um texto para deixar aqui esse pedaço de informação – a qual espero que, junto a vocês, possa ser transformada em conhecimento.
Sempre que posso, digo que é preciso deixar um registro daquilo que aprendemos na vida. Um dia, inevitavelmente, morreremos; e tudo que temos e somos fisicamente existirá de forma não muito significativa ao ponto de nos representar como seres humanos. Sei que amanhã os carbonos, hidrogênios e enxofres que constituem o meu corpo estarão rastejando sob a forma de uma uma minhoca, ou voando no corpo de uma mosca – a isso chama-se distribuição energética na cadeia alimentar. Entretanto, algo pode ser deixado para os que me sucederem, e é o meu conhecimento e informações, mas na forma de um registro.
Todos vivemos constantes alterações pessoais e emocionais que, de certa forma, ensinam-nos (ou poderiam nos ensinar) algo ao longo da vida. E, acredite, esses sentimentos e essas experiências repetem-se em outras pessoas; se tivermos a oportunidade de entender e anotar as nossas emoções, que foram também sentidas e traduzidas por outrem, estaremos otimizando a nossa vida e a dos que tiverem contato com ela.
Para que sofreríamos profundamente de um determinado evento se outra pessoa já passou por ele e nos deixou sugestões de como encará-lo e superá-lo? Sem dúvidas, cada humano sente a vida sob sua própria luz existencial, mas não podemos negar que algumas experiências, que não as nossas, são potencialmente ajudadoras. Veja isso na filosofia de Sócrates e Platão, por exemplo, os quais há mais de 2400 anos escreveram sobre a Vida e sobre o ser humano, e que ainda hoje serve-nos de “bússola” para um caminho a ser trilhado. Platão e Sócrates, por sua vez, também aprenderam de tradições ainda mais antigas, como as dos egípcios, e estes certamente que observaram ensinamentos mais antigos, que não tivemos um acesso direto. Se não fosse essa ponte entre os sábios estaríamos escrevendo o Mito da Caverna à cada geração. Será que seríamos tão formidáveis a ponto de escrever esse tipo de coisa tantas vezes? “”Talvez“” sim. Mas, sem dúvidas, tê-lo pronto e, a partir daí, expandirmos o nosso pensamento ajuda-nos a crescer mais rápido. Quem sabe, se o foco da humanidade fosse aprender verdadeiramente, ao invés de apenas somar riquezas, estaríamos mais longe enquanto Humanos. [Infelizmente, até as informações, hoje, figuram entre os tesouros das nações]
Portanto, faça-o!
Costumo recomendar aos meus amigos e às minhas amigas que busquem sempre por uma maneira de organizar seus pensamentos. Ainda que seja difícil acreditar que isso valha para todos os Homo sapiens, todos nós pensamos. Acontece que alguns pensam por conta própria, utilizando de conhecimentos prévios como embasamento, enquanto outros, para não terem trabalho, apenas pensam que pensam, mas reproduzem fielmente a ideia de um grupo específico, acreditando ser autênticos e originais – a esses chamo de “massa de manobra“. Seja “assim ou assado“, a partir do momento em que organizamos as nossas ideias, tratando de conhecê-las em sua origem e forma, em uma hora ou em outra descobriremos se somos os pensantes autônomos ou a massa de manobra.
A maneira como você organizará os seus pensamentos poderá acontecer sob uma variedade espetacular de possibilidades. Eu optei pela escrita e pelo desenho, embora este último está um tanto quanto lento. Já em ralação à escrita, aos poucos vou traduzindo em palavras o que aprendi, buscando sempre entender a mim mesmo e aos que me cercam.
Caros leitores, não deixem de registrar os seus conhecimentos. Como eu disse logo na primeira linha desse texto, vivemos em uma era digital, na qual tudo circula muito rapidamente. Se uma notícia pode chegar do “outro lado” do mundo em questão de segundos fica evidente o potencial que tem esse meio de transmissão de informações. Então, porque não lançamos mão dessa ferramenta para agir em prol do outro? Podemos escrever textos em blogs, relatar nossas experiências e nossos anseios, deixar uma fagulha na mente de alguém, ou qualquer outra coisa que possa agregar valores positivos no outro. Mas não se esqueçam, a escrita é uma possibilidade, mas não a única. Expresse-se da maneira que melhor traduz os seus pensamentos.
Recentemente, falando com um grande Amigo, autor do Blog [Des]Construindo Porquês, ele disse-me “Sinto que algumas ideias existem na minha cabeça de forma que chego a acreditar que palavras são quase desprezíveis. Às vezes, tenho dificuldades de traduzir minhas ideias em palavras da língua. Acredito que seja assim em outros seres humanos…”. Eu respondi-o da seguinte maneira: “Provavelmente! Sinto-me assim também! Por isso tento sempre treinar uma maneira de traduzir o que penso para palavras… afinal, minha maior intenção é poder passar adiante o pouco conhecimento que eu puder absorver… e isso só se dará (no meu caso) por palavras – não sou Mozart, nem Da Vinci, nem Michelangelo… preciso, no mínimo, das palavras“. A partir daí, surgiu-me o interesse em escrever esse texto. Está registrado!
Frases sobre “escrever”:
“É mais seguro escrever algo do que falar; falando, improvisamos, para escrever refletimos.”
[Frase atribuída a Mariano José Pereira da Fonseca (o Marquês de Maricá) – Brasil (1773 – 1848)]“Para mim, escrever é apenas uma conversão das minhas forças em frases.”
[Frase atribuída a Joseph Conrad – Ucrânia (1857 – 1924)]“É melhor escrever errado a coisa certa do que escrever certo a coisa errada.”
[Frase atribuída a Antônio Gonçalves da Silva (o “Patativa do Assaré”) – Brasil (1909 – 2002)]“Escrever é uma maneira de falar, sem sermos interrompidos.”
[Frase atribuída a Luiz Felipe Angell de Lama (o Sofocleto) – Peru (1926 – 2004)]
#VocêJáParouParaPensar?
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Andreone T. Medrado
Devaneios Filosóficos
A imagem utilizada para compor a capa dessa publicação foi obtida aqui.
Andreone, sempre me surpreende com esses textos! Fico extremamente grato. Posso dizer que melhorei bastante minha forma de escrita, minha fluidez de raciocínio, minha organização textual, graças a existência do seu Blog. Muito obrigado por contribuir diretamente com meu conhecimento e com a diversidade dos conteúdos que estou tratando em Diário do Vestibulando de Medicina. É muito bom vir aqui e encontrar um conteúdo completamente diferente dos clichês que estão livres na Web. Simplesmente, obrigado! ❤
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Poxa!!! Que palavras!!! Que posso eu dizer delas senão MUITO OBRIGADO!!!
Fico realmente agradecido por saber que, antes de ter meus átomos formando o corpo de minhocas e moscas, pude ser útil na Terra! Além disso, nossa amizade é uma amostra do potencial que tem um Blog, conhecemo-nos via esse meio de comunicação e, o mais importante, crescemos como seres humanos a partir do compartilhamento de conhecimentos. Isso é incrível!!
Acompanho o seu Blog, e ele é uma excelente fonte de saberes e de reflexões! O último texto sobre Cotas Raciais está fantástico!
Um forte abraço!
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