Você já parou para pensar em o que de ti ficará quando você morrer? Acredite, todos morreremos! Ademais, sabemos que a matéria orgânica que nos forma hoje está em constante rearranjo, dia após dia. Também, é sabido que após a nossa morte tudo que existe em nós será decomposto por fungos e bactérias, além de ter a participação especial de muitos outros seres vivos. Eu, por exemplo, sei que após minha morte esse carbono que me compõe poderá formar os metanefrídeos de uma minhoca, ou os espiráculos de uma barata. O que torna notório que não sou esse corpo, nem esse corpo é meu.

Mas, então, o que de não material fica de nós? Algo desse tipo fica de nós?

É complexo dizer se e o que de nós fica nessa Vida. Suspeito de que, se algo imaterial fica, são as nossas mensagens – aquelas que “escrevemos” enquanto vivos! Suspeito, também, que coisas ficam na Vida, nem sobem, nem descem, mas ficam. É um fluxo interminável… só não pergunte qual o seu sentido. Falarei do que penso em um texto futuro [se e quando eu encontrar uma maneira de expressar isso].

Obviamente que nenhum desses questionamentos são perdidos. Fazem parte do pensamentos que passam por mim e eu tento traduzi-los aqui. E foi assim quando lembrei-me do ano de 2009.

Eu tive um Amigo. Não era uma amizade com “a” minúsculo; era uma Amizade verdadeira. Éramos tão amigos que ele era sempre ele, e eu, sempre eu; nunca precisamos de um mínimo esforço para sermos quem éramos, nossos defeitos e nossas diferenças não faziam a menor diferença. Ele, o João, morava em uma casa pequena, cuidava de sua mãe – Dna. Lurdes, uma senhora muito enferma, sempre com a mais nobre dedicação. O mais interessante é que, apesar dele viver com uma saúde muito sensível – sequelas deixadas pela forte pneumonia sofrida aos 16 anos -, aos 30 cuidava de sua mãe como se cuidasse de um bem precioso. Sua fraqueza advinha do fato de que um de seus pulmões estava “inutilizável”, enquanto o outro estava seriamente comprometido; seu porte físico era singelo, magro e frágil. Apesar de tudo isso, não me lembro de uma só vez tê-lo visto de outra maneira que não sereno e com um sorriso puro e sincero em sua face. Independentemente de sua situação física ou financeira, o João nunca negou palavras amigas e conselho sinceros a quem quer que fosse.

O tempo passou, e o meu amigo se casou. Encontrou uma pessoa tão especial quanto ele para dividir a vida. Formavam um casal lindo, eu sentia uma alegria enorme em poder estar com eles – às vezes eu exagerava, pois em qualquer oportunidade que tinha eu estava lá. Tomar um café e tocar o órgão eletrônico era praticamente um ritual que eu executava religiosamente em sua casa! Sem dizer que ele foi o meu instrutor de violino por alguns anos. Quando a sua campainha tocava ele até sabia que o “André” estava ali… Sim, chamava-me de André, dizia ser mais prático.

Infelizmente, em 2009 o meu amigo precisou ser internado por motivos de recaídas na saúde. Seu pulmão não parecia muito forte para mantê-lo entre nós. Nessa época, eu que trabalhava como estagiário de biologia em um petshop, quase não tinha tempo para sair, era uma rotina maquinal: de casa para o trabalho, do trabalho para a faculdade e de volta para casa… assim o era sempre – raros eram os domingos livres. Foi quando, ainda em 2009, depois de umas duas semanas que ele estava internado, eu, como de costume, liguei para ele pela manhã. Eram aproximadamente às 10h30. Conversamos bastante, brincamos e fizemos mil e um planos; planejei uma visita ao hospital, embora, apesar de estar programado para passar por uma cirurgia, ele afirmasse que havia tido uma melhora e que talvez receberia alta. Como em toda cirurgia, o risco era presente. Não deu tempo! Na madrugada do dia seguinte, por volta das 2h, o meu celular tocou. Era a irmã do João, dizendo “André, o João acabou de falecer!“.

Hoje, nove anos depois, não sou capaz de me lembrar de sua voz. É como se, com o tempo, aquela voz fosse desaparecendo da minha memória, dando espaço apenas à ideia da voz. Já ouvi isso de outras pessoas, dizem quem a voz se perde nas lembranças. O que tenho do João? Não me resta nada dele que não seja no plano da memória. No fim das contas, o ser humano se vai e não leva nada do que tinha aqui; tudo fica, mas nada disso tem valor intrínseco; são apenas coisas que também se acabam com o tempo. Entretanto, uma coisa ficou, e essa ninguém pode apagar: a mensagem do João. Ele deixou a mensagem de que nossa vida não é o que temos dela aqui,  e sim o que fazemos enquanto vivos; não somos nossas vitórias nem nossas derrotas – somos a somatória dessas experiências; não precisamos nos desesperar se algo parecer errado; não devemos absorver as mazelas da vida – apenas devemos aprender com elas. Talvez a lição mais importante que ele me ensinou foi o valor do sorriso sincero e sereno! Estar sereno diante da vida nos faz enxergar melhor o nosso caminho! Ele sabia que coria o risco de problemas pulmonares a qualquer momento, nem por isso deixou de existir enquanto ser Humano. Ajudava a todos quanto pudia, jamais esperava recompensas pelos seus feitos! O João sabia amar. Na estatura humana ele era mediano, mas era um ser Humano enorme! O homem é do tamanho da sua generosidade!

#VocêJáParouParaPensar? Qual é o seu tamanho enquanto Humano? Qual é a sua mensagem? Qual é a sua obra? Reitero a pergunta: você já parou para pensar em o que de ti ficará quando você morrer? Você vive uma vida pautada em princípios e valores Humanos?  Ou você vive fugindo temerosamente da morte, buscando para isso qualquer que seja a fonte de alienação? Uma humilde sugestão: não veja a morte como a um problema, ou como a um inimigo. Sócrates já dizia que se conhece um sábio pela serenidade com que ele lida com a morte. Temer o inevitável não é ser sábio.

Pergunto-te ainda mais: como estamos nos relacionando com as pessoas ao nosso redor? Cícero, um orador da Roma Antiga, dizia “certifica-te de que és um fator de soma na vida das pessoas de quem participa“. Estamos somando ou subtraindo na vida das pessoas? Como estamos fazendo isso?

Todos partiremos, isso é um fato; Mas temos dia após dia para trabalharmos uma mensagem de Vida. Podemos ser mais que ontem, sempre! Podemos ser Humanos de valor!

O que de não material fica de nós?

Termino essa reflexão utilizando-me das palavras de um sábio chamado Lao-Tsé: “Ser profundamente amado por alguém nos dá força; amar alguém profundamente nos dá coragem. 

 

#VocêJáParouParaPensar?

Andreone T. Medrado
Devaneios Filosóficos