Um pouco de Contexto & Introdução

Sair do armário, não deve ser mais segredo para ninguém, quer dizer se assumir gay. Também pode ser usada para outros grupos que às vezes se ocultam, como ateus. É uma importação do movimento gay americano. Mas o que o armário tem a ver com isso? Alguém, um dia, literalmente saiu dele?

O armário só foi surgir nos anos 1960. Antes se falava em take off the mask (“tirar a máscara”), let his hair down (“soltar o cabelo”) ou drop the hairpins (“deixar cair os grampos”). É o que afirma o historiador George Chauncey, da Universidade de Yale e autor de Gay New York (sem tradução). Segundo ele, armário foi importado de outra expressão popular nos EUA: skeletons in the closet “esqueletos no armário” – um segredo condenador guardado a sete chaves. Numa evolução criativa, o armário passou a conter o próprio gay não assumido.

FONTE (Leia o texto completo): Aventuras na História – De onde vem a expressão “sair do armário”

Curiosidades à parte, comecemos então a abordar o assunto. Como você deve suspeitar, se já não tiver certeza, essa publicação falará sobre a saída do armário. Mas sobre a saída de quem? Sobre a minha mesmo!

É muito comum ouvir dizer que alguém saiu do armário, e esse termo é utilizado, como visto acima, em inúmeras situações. Por exemplo, eu já saí do “armário religioso“, por assim dizer. Frequentei determinada religião durante 30 anos, mas chegou uma hora que o volume de questionamentos foram tantos que aquele diminuto espaço de conceitos engessados não foi o suficiente para mim. Eu saí do armário religioso pela primeira vez, hoje me sinto muito melhor por isso. Quem outrora se considerava um religioso praticante, evangélico, hoje é ateu. E passo bem, muito obrigado!

O que pouquíssimas pessoas entendem é que essa tal saída do armário envolve uma série de atitudes primeiramente internas  que dizem respeito ao próprio indivíduo – e, depois, mas não necessariamente em tempos diferentes, externa, que se refere a todo o contexto sociocultural no qual essa pessoa está inserida. Além disso, não saímos do armário apenas uma vez na vida, e nem por um único motivo. Se você ler o meu texto sobre liberdade, e trocar o termo “caixas“, ali usado, por armário conseguirá fazer uma ótima analogia com essa nossa conversa. Em resumo, eu digo que somos presos dentro de várias caixas, e que uma menor está dentro de outra maior. Aqui é a mesma coisa. Somos trancados dentro de um armário, que está dentro de outros armários. Quem acredita precisar sair apenas de um para que tudo esteja resolvido, talvez ainda não tenha saído de nenhum, ou, na melhor das hipóteses, não entendeu nada do que isso significa. E, não perca de vista uma ideia: cada pessoa tem os seus armários; e sair deles não é necessariamente uma regra – depende de muito fatores, que não cabe a ninguém julgá-los senão à própria pessoa. Isso é sério!

 

Somos seres complexos?

Acho justo, se não necessário, salientar que na nossa vida não existe um setor geral, em que tudo acontece, ou no qual uma decisão vale por todas. Por outro lado, também não é maduro afirmar que tudo acontece de forma independente, e que uma ação em determinado aspecto da nossa vida orgânica/psicológica não impactará outros “setores”.

O que quero dizer é que somos um conjunto complexo de informações, experiências, emoções, sentimentos e que, consequentemente, estamos conectados por várias vias. Sendo bastante frio, porém realista, eu diria que somos um conjunto de algoritmos bioquímicos, que interagem com o meio ambiente externo e interno e que recebe estímulos e emite respostas – tudo isso ocorre dentro de certas [bio]lógicas, mas sempre de forma interconectada. Esses somos nós, “pacotes de informações” que se interconectam.

Contudo, se minha explicação pareceu-te muito fria, talvez você escolha dizer que somos seres especiais, dotados de capacidades cognitivas avançadas (seja lá o que isso signifique), com o diferencial natural do pensamento simbólico e da capacidade de raciocinar e que, a partir de um treinamento contínuo, podemos adquirir a habilidade do autocontrole emocional. Mas, sinceramente, acho que nos reduzir a essas meras abstrações é bastante ingênuo. De toda forma, ficam essas duas opções para você.

 

Por que eu “quis” sair do armário?

Por quê? É uma pergunta bastante complexa, mas nem por isso difícil de ser respondida. Eu poderia redigir todo um texto e falar tudo de novo, mas eu abordo essa questão em uma publicação bastante boa – chamada Sexualidade – pensando abertamente – e farei um “autoplágio” colando apenas um trecho do texto abaixo:

Por experiência própria, digo que a nossa existência no ambiente familiar pode nos induzir a acreditar em quase tudo como uma verdade única. Fui criado desde que nasci em uma família dita tradicional (um pai XY, uma mãe XX e irmãos). Além disso, a minha família era evangélica praticante; fui ensinado desde cedo a estar dentro da igreja, a não perder cultos e a seguir todos os mandamentos e a obedecer rigorosamente sob pena de punição eterna respeitar a doutrina. Cresci ouvindo afirmações de que existem coisas para meninos e coisas para meninas, mas que não se misturam nunca; que meninos são os fortes, os donos da casa, enquanto as meninas são as mais sensíveis, as quais devem aprender a cozinhar para seguirem uma carreira de “belas, recatadas e do lar”. Meninos com um comportamento mais “delicado” eram logo chamado para a “realidade”, não podiam ser sentimentais. Meninas que falassem palavrões? Não! Mulher deve se dar o respeito desde cedo.

Assim fui crescendo, aprendendo que aqueles comportamentos que se desviavam do heteronormativo provinham de demônios, e que precisavam ser expulsos. Um dia, no ensino fundamental, quando precisei ir cedo à casa de um amigo onde um grupo de estudantes montaria um painel de cartolina para ser apresentado no mesmo dia na escola, pedi que o meu pai me levasse de carro, já que ele levaria meus outros irmãos que estudavam de manhã. Ele acordou nervoso naquele dia, sabe-se lá porquê; mas certo é que ele não gostou que eu também acordasse cedo para fazer esse trabalho com colegas (havia meninos e meninas), especificamente na casa de um menino com quem eu formava dupla todos os dias nas aulas e que por anos fomos muito amigos; chegando próximo do local, ele disse com voz raivosa: “você não virou bicha não, né?“. Não sei se foi porque esse estigma do homossexual sempre foi visto como maldição no meio em que eu existia, ou se foi porque os meus irmãos também estavam no carro e ouviram tudo, mas aquilo me marcou muito – talvez tenha sido a dura combinação das duas coisas. Além de descobrir um dos medos latentes do meu pai, foi ali que tive a certeza de que pessoas com raiva dizem coisas que estão guardadas por muito tempo em suas entranhas. Se esse evento mantém-se claro em minha mente há mais de 17 anos, imagine como é a sessão “frases traumáticas” na mente de uma pessoa que sofre coisas muito piores, desde violências verbais até físicas.

Acontece que, desde onde sou capaz de me lembrar, reconheço muito bem de que sempre senti atração física – seja sentimental ou sexual – por homens e por mulheres (isso é ser Bissexual). Porém, saber disso não queria dizer muita coisa se eu considerasse o ambiente em que eu vivia e a cultura violenta à qual eu pertencia (e ainda pertenço). O mecanismo que encontrei para lidar com aquela situação e permanecer quieto no armário foi trancá-lo e jogar a chave fora. Eu me forçava a acreditar que eu era hétero e que a única possibilidade para a minha vida era sentir atração sexual pelo sexo oposto; e ponto final. Tanto era assim, que eu “acreditava” que pessoas que se envolvessem com outras do mesmo sexo estavam fazendo a coisa errada – mas, embora eu achasse errado, não achava que a pessoa estava necessariamente condenada, eu apenas pensava que Deus pudesse, em algum momento e de alguma maneira, purificá-la (ou seja, “fazê-la” ser heterossexual). Por outro lado, como eu não havia me “permitido” gostar efetivamente de pessoas do mesmo sexo que eu, também não queria correr o risco de perder a “vaga” tão cobiçada lá no paraíso. Tudo não passava de armadilhas que eu mesmo criava para poder conviver no meu meio social. Muitas outras fantasias precisaram existir para que eu não valorizasse mais o meu gosto que o das pessoas egoístas.

Recorrendo mais uma vez ao meu texto, eu acredito que não existe prisão mais cruel do que aquela em que se é preso sem haver cometido crime algum. Pior ainda é não perceber, mas ser induzido a você mesmo se conduzir à prisão e, com suas próprias mãos girar a chave do cárcere e jogá-la fora após tê-la trancado. É isso que acontece quando vivemos em uma sociedade de estrutura homofóbica, que antes mesmo do nascimento de um Homo sapiens já lhe garante todos os direitos e deveres que foram impostos há gerações. Este pobre ser, que, independentemente de seu sexo biológico, poderia enxergar-se como outra orientação ou identidade sexual, não tem muito tempo para se expressar como queira. Tudo que fizer será imediatamente combatido por remediadores inconscientemente voluntariados ao sistema”. Vive-se uma frenética busca de si mesmo, mas raramente esse “si mesmo” é apontado dentro do indivíduo; geralmente nos mostram modelos fixados e padronizados na sociedade e nos dizem “sigam isso, dessa forma, para essa finalidade“. O nome disso é tortura, não existe outro termo melhor!

Demorei muito para entender isso. Resisti bastante em me aceitar como sempre fui. As razões são muitas, mas eu acredito que a principal foi o medo de estar errado. É um medo irracional, que nos direciona para o caos da nossa própria existência. O tempo passou e, como eu disse lá em cima, muitos questionamentos surgiram e foi a partir disso que eu me vi dentro de um sistema dominador e frio, que não quer saber quase nada do que se passa dentro de cada indivíduo, apenas “nos ordena que louvemos entre quatro paredes, no santuário de suas mentiras“. Mas isso consome demais a pessoa. E foi por todas essas questões sufocantes que precisei me encontrar nesse aspecto e sair desse armário que já estava mofando e sem ventilação. Isso não responde a todos os porquês, mas certamente diz que foi uma razão bem urgente. Sair do armário não era, para mim, uma questão de me mostrar ao mundo, era uma questão de me mostrar primeiramente para mim mesmo. Eu saí do armário da sexualidade pela primeira vez.

 

Como eu saí do armário?

Dependendo de quem é você e do quanto você me conhece, talvez diga que nem sabia que eu estava dentro de um armário desse tipo; ou, ainda, que nem sabia que eu já havia saído dele. Pois bem, como diz uma amiga, “só não te conhece que não lê os seus textos no Blog, porque tudo que você pensa está ali“; e ela tem razão. Não tive uma família que prezava pela leitura, logo, não é algo muito recorrente vê-los lendo textos não-proféticos [ou outros tipos de Fake News] na internet. Pode até ser, também, que você seja alguém da minha parentela que veio ler esse texto porque ficou muito curioso(a), para não dizer decepcionado(a); seja como for, leia-o com atenção.

Voltando ao tema… Toda saída do armário envolve uma série de decisões que devem ser exclusivamente tomadas por quem está nesse armário, ninguém tem o direito de dizer quando e como essa decisão deve ser tomada. Além disso, não existe uma idade mais adequada para se sair do armário – cada fase da vida tem suas próprias complexidades, então, sem julgamentos outra vez!

Quando eu comecei a me questionar profundamente sobre a minha sexualidade eu já era casado [com uma mulher]. Então, eu ficava analisando se valeria a pena trazer essa informação para fora do armário e dizer o que eu pensava e quem eu de fato era. Foram momentos de bastante insegurança. Ela vinha de uma família tão tradicional e cegamente religiosa quanto a minha – até hoje, falar sobre sexualidade é um tabu quase demoníaco nesse núcleo dito familiar. E isso me fazia pensar em como ela reagiria. Apesar disso, posso dizer que tive o privilégio de ter um relacionamento que, assim como eu, não segue os padrões sociais à risca: não vivíamos a ideia de que éramos um só corpo, ou de que éramos uma unidade matrimonial; pelo contrário, sempre buscamos respeitar o espaço individual do outro. Isso foi fundamental para que nos conhecêssemos melhor, e com isso pude ir testando qual seria o melhor momento de falar da minha sexualidade com a minha parceira. A amizade era [e ainda é] a coisa mais importante para nós, e amigos contam o que pensam.

Antes de eu pensar em falar para a minha companheira, eu comecei a pesquisar sobre o assunto, a entender melhor o que era a comunidade LGBTQ+ e a conhecer a diferença em cada subgrupo. Conhecimento é poder; e, nesse caso, é poder se reconhecer. Junto a esse processo, eu comecei a acessar mais as redes sociais, criei uma página no Facebook, montei o meu Blog e fiquei mais ativo no Instagram.

Certo dia – há menos de um ano -, de forma bastante inesperada, um homem (que chamarei aqui de CR) me mandou mensagem via direct, no Instagram. Começamos a conversar sobre várias coisas – eu não tenho problemas em falar de vários assuntos com ninguém que não se feche a uma ideia dogmática. Ao longo da conversa, ele começou a tocar em assuntos mais íntimos; certo é que o tema sexualidade apareceu, e posso dizer que foi a primeira vez na minha vida que falei com alguém [sobretudo do mesmo sexo] a esse respeito – ele é bissexual também. E, sim, foi importante para mim! Eu saí do armário da sexualidade pela segunda vez. Mas tinha um detalhe, eu não escondo as coisas da minha companheira, e comentei com ela sobre isso, inicialmente para ver sua reação. Comecei lançando o assunto como se o CR estivesse interessado em mim, e vi a reação dela, que achou aquilo engraçado, mas certamente que não passou por sua mente que eu pudesse ser bissexual. Foi então que eu decidi contar sobre minha sexualidade – arrisquei mesmo. Eu saí do armário pela terceira vez.

Para minha “surpresa” e conforto, apesar de inicialmente ter ficado em choque (o que é absolutamente compreensível), ela me apoiou e me apoia até hoje. A nossa amizade nunca deixou de ser algo fundamental, como sempre foi – arrisco dizer que hoje é ainda mais forte. A partir daí, eu tive ainda mais liberdade de pensar e falar sobre isso, pois alguém já sabia “de mim” para além do que era visível. Foi quando eu decidi sair do armário pela quarta vez, ao escrever o texto já citado, sobre Sexualidade, que foi o momento que tornei pública essa informação. Embora pública, poucas pessoas da minha família já leram esse texto. Mas muitos amigos e amigas o viram, e sei de casos em que o texto foi inspirador – e isso me alegra.

Resumindo, eu não saí do armário uma única vez, nem por um único motivo. Tampouco, iludo-me acreditando que fiz tudo. Não pretendo em momento algum reunir a família e dizer “Gente, eu sou bissexual!“; eu não falaria de um assunto tão importante com pessoas que não estariam dispostas a me ouvir. Porém, é claro, eu falaria abertamente se fosse questionado a esse respeito. Outros armários precisam ser abertos. E serão. Já estão sendo…

 

Por que falar disso?

Eu poderia escolher manter as minhas experiências em âmbito privado, somente para alguns amigos e amigas. Mas eu defendo a representatividade, em todos os sentidos. Por exemplo, hoje em dia sofremos uma carência de representatividade Negra – isso em uma sociedade composta majoritariamente por negros. Temos poucas referências de negros e de negras em novelas (com papéis principais), na moda, em outdoors, nas universidades, etc. O resultado disso é a falta de identificação na população negra como parte da sociedade. É importante que haja representatividade para que as pessoas se enxerguem dentro do sistema de diversidade. Com a questão da sexualidade não é diferente. Apesar dos riscos que sofremos enquanto membros da comunidade LGBTQ+, é extremamente importante que outras pessoas vejam representantes de diferentes orientações e identidades sexuais, pois isso pode encorajá-las a buscar pelo autoconhecimento e pela autoaceitação.

Aceitar a si mesmo não é um processo tão simples. Algumas pessoas são idosas, mas até então não se aceitam como são, preferem aderir ao que – em uma publicação – chamo de obsolescência humana programada, ou seja, aceitam que têm prazo de validade conforme ficam mais velhas e passam a não se reconhecer enquanto seres individuais, e se preciso for, modificam-se para serem aceitas na comunidade – quando na verdade não têm a aceitação de si, que é o mais importante. Então, quanto mais pudermos ajudar, melhor; e fazemos isso mostrando que está tudo bem em ser você mesmo(a), que nos oferecemos como ombros amigos, que também passamos por situações semelhantes e que é normal não se sentir pertencente a uma normatividade tóxica.

Por outro lado, como representar alguém se não nos representamos a nós mesmos? Complicado, não? Isso é circular… ou deveria ser. Quanto mais pesquisamos, buscamos entender a diversidade e nos conhecemos, mais podemos passar essas experiências adiante e encorajar outras pessoas que talvez (e bem provavelmente) estejam passando por algum tipo de sofrimento por omissão. Se eu pude aprender sobre sexualidade em minhas pesquisas e experiências de vida foi porque alguém em algum momento decidiu falar de si para o mundo. Mesmo com toda essa onda de intolerância vemos pessoas se mostrando, manifestando seus ideias e lutando pelas causas diariamente para que suas vozes e a voz da comunidade LGBTQ+ seja ouvida; por que eu ficaria quieto e calado? Posso ajudar de alguma maneira, e sei que passo a passo farei minha parte. Escrever textos sobre o assunto, e me impor diante dessa causa é uma dessas maneiras.

Desconfio que muitas pessoas não se conhecem direito a ponto de saberem com clareza o que de fato elas são. Quantos Andreones deve haver por aí que não se permitem pensar sobre sua sexualidade porque utilizam de mecanismos danosos para se omitirem diante de seus pensamentos e de sua própria personalidade? Quantos Andreones acreditam que é errado ser quem eles são e, por isso, calam-se? Ainda insisto: quantos Andreones e CRs vivem em famílias dogmáticas e intolerantes e tem receios de falar de si mesmos?

Eu quero ser a pessoa que ajudará alguém a olhar para si e se questionar profundamente sobre a sua sexualidade! Quero ser aquele que lançará uma brasa na lenha de quem tem medo de se acender; quero poder ao menos dizer “olhe para você com mais atenção”. Acender a vela do próximo não diminui a nossa chama, e ainda pode ajudar a iluminar um mundo!

Quando alguém olha para mim e diz que estou em dúvida sobre a minha sexualidade, mas que estou casado com uma mulher para “fazer média”, não me resta dizer outra coisa senão “I picked a partner, not a side!” [“eu escolhi uma parceira, não um lado!]. Essa frase foi dita recentemente por Misty Gedlinske, em um TedTalk, em 2019 e eu achei brilhante!

É como dizer que estou em cima do muro. Mas que muro? Dizer que alguém “está em cima do muro” pode falar mais da sua indecisão do que da indecisão desse alguém. Certas coisas não são escolhas, mas fatos não premeditados. Agora, criar muros para tudo, sim, pode muito bem ser uma opção, e é uma escolha bem prejudicial. Portanto, caso você ainda insista em fazer isso, lembre-se de não colocar as pessoas em cima do seu muro! Também Não me coloque no SEU muro, sei muito bem aonde estou! E estou seguro disso! A boa notícia é que se foi você quem criou esse muro [conceitual], então, você também pode derrubá-lo. Precisamos de mais ama-BI-lidade!

Não há muros.png

Literatura para ilustrar…

Para demonstrar o quão difícil pode ser o processo de entender e expor a sua sexualidade, bem como a importância da representatividade e da autoaceitação, trouxe uma citação que parte do Brasil conhece. Retirei o trecho de uma questão cobrada no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio – questão de nº10, no caderno cor de rosa) de 2018, que aborda esse assunto de uma forma tão interessante. É um fragmento do conto “Vó, a senhora é lésbica?“, de Natalia Borges Polesso:

Vó Clarissa deixou cair os talheres no prato, fazendo a porcelana estalar. Joaquim, meu primo, continuava com o queixo suspenso, batendo com o garfo nos lábios, esperando a resposta. Beatriz ecoou a palavra como pergunta, “o que é lésbica?”. Eu fiquei muda. Joaquim sabia sobre mim e me entregaria para a vó e, mais tarde, para toda a família. Senti um calor letal subir pelo meu pescoço e me doer atrás das orelhas. Previ a cena: vó, a senhora é lésbica? Porque a Joana é. A vergonha estava na minha cara e me denunciava antes mesmo da delação. Apertei os olhos e contraí o peito, esperando o tiro. […]

[…] Pensei na naturalidade com que Taís e eu levávamos a nossa história. Pensei na minha insegurança de contar isso à minha família, pensei em todos os colegas e professores que já sabiam, fechei os olhos e vi a boca da minha vó e a boca da tia Carolina se tocando, apesar de todos os impedimentos. Eu quis saber mais, eu quis saber tudo, mas não consegui perguntar.

POLESSO, N. B. Vó, a senhora é lésbica? Amora. Porto Alegre.  Não Editora. 2015 (fragmento).

Então é isso! Hoje estou saindo do armário pela quinta vez. E nem sei quantas outras virão, nem como elas serão. Mas farei isso quantas forem necessárias!

E você, que me lê agora, seria o seu caso o de estar se questionando a respeito da sua sexualidade? Ou você é alguém que não está em dúvidas mas que conhece quem esteja? Você tem alguma experiência que possa servir de apoio e de encorajamento e empoderamento para os leitores do Blog (e para mim também, é claro)? Deixe seus comentários abaixo, ajude-nos a ampliar a nossa rede de apoio e de representatividade. Pense sobre o seu armário – se esse for o seu caso. Pense sobre você!

 

vjppp

 

Andreone T. Medrado
Devaneios Filosóficos

 

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NOTA: a imagem das cores do Orgulho Bissexual, utilizada para compor a capa dessa publicação foi obtida aqui.